O Brasil deu um passo histórico na reforma do sistema tributário com a sanção da Lei Complementar 214, nesta quinta-feira (16). A nova legislação, que entra em vigor a partir de 2026, traz mudanças significativas na forma de cobrança de impostos sobre o consumo, com o objetivo de simplificar o sistema atual e promover justiça fiscal. A lei é resultado do Projeto de Lei Complementar (PLP) 68/2024, aprovado pelo Congresso Nacional em dezembro, e prevê a implementação do Imposto sobre Valor Agregado (IVA) em um modelo dual, além de outras medidas que impactarão setores estratégicos da economia.
O que muda com o IVA dual?
A principal inovação da reforma é a criação do IVA dual, que será dividido em duas categorias: o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), destinado a estados e municípios, e a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), de competência federal. Juntos, eles substituirão cinco tributos atuais: ICMS, ISS, PIS, Cofins e IPI. O IVA tem como característica incidir apenas sobre o valor agregado em cada etapa da produção, evitando a cumulatividade de impostos que encarece produtos e serviços ao longo da cadeia produtiva.
Segundo o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, presente na cerimônia de sanção da lei, o novo sistema é “mais simplificado, equilibrado e justo”, além de combater a guerra fiscal entre os estados. A expectativa é que a reforma impulsione um crescimento econômico de 10% a 15% nos próximos anos.
Implantação gradual e testes a partir de 2026
A transição para o novo sistema será gradual. Em 2026, começará um período de testes em que as empresas deverão incluir nas notas fiscais os valores correspondentes aos novos tributos, mas sem efetivamente recolhê-los. O objetivo é avaliar a viabilidade do modelo e fazer ajustes necessários. A implementação completa está prevista para 2033, com revisões a cada cinco anos.
A alíquota-padrão do IVA deve ficar em torno de 28%, mas o texto prevê que o governo adote medidas para reduzi-la a menos de 26,5% até 2030. A cobrança será igual para todos os produtos e serviços, com exceção de itens específicos que terão reduções ou isenções.
Isenções e benefícios sociais
A reforma traz medidas de justiça social, como a isenção de impostos para alimentos da cesta básica, incluindo arroz, feijão, leite e carnes. Produtos de saúde menstrual, como absorventes, também estarão isentos. Além disso, famílias de baixa renda (com renda per capita de até meio salário mínimo) terão direito ao cashback, um mecanismo de devolução de tributos pagos em serviços como energia elétrica, água, gás, internet e telefonia.
O relator do PLP 68/2024, senador Eduardo Braga (MDB-AM), destacou que a reforma vai além da simplificação, promovendo justiça social e reduzindo a carga tributária ao longo do tempo. “Minha expectativa é de que a carga tributária brasileira caia, com a redução da sonegação e do contencioso jurídico, garantindo mais investimento, crescimento, emprego e renda”, afirmou.
Imposto Seletivo e setores estratégicos
A nova legislação também cria o Imposto Seletivo (IS), conhecido como “imposto do pecado”, que incidirá sobre produtos considerados nocivos à saúde e ao meio ambiente, como cigarros, bebidas alcoólicas e veículos. A cobrança será única e tem como objetivo desestimular o consumo desses itens.
Setores estratégicos, como saúde, educação e segurança da informação, terão reduções de alíquotas que variam entre 30% e 70%. No entanto, o presidente da República vetou benefícios para alguns serviços financeiros, como seguros relacionados a roubo de dados e sistemas de segurança, alegando que não estavam previstos na Constituição.
Vetos e ajustes
Dos 28 vetos aplicados à lei, alguns geraram polêmica, como a exclusão de fundos patrimoniais e de investimentos da lista de não contribuintes. O governo justificou que esses setores não se enquadram nas hipóteses de isenção previstas na Constituição. Outro veto retirou benefícios fiscais da Zona Franca de Manaus (ZFM), sob a alegação de que a região já não apresenta vantagem competitiva em relação ao restante do país.
Comitê Gestor e próximos passos
A lei cria um Comitê Gestor temporário para regulamentar o IBS até o fim de 2025. A expectativa é que o órgão garanta a implementação dos testes iniciais em 2026, enquanto o Projeto de Lei 108/2024, que estabelece o comitê permanente, ainda tramita no Congresso.
A reforma tributária representa um marco na história econômica do Brasil, com potencial para simplificar o sistema, reduzir desigualdades e impulsionar o crescimento. No entanto, sua efetividade dependerá da capacidade de adaptação dos setores envolvidos e da fiscalização rigorosa para evitar distorções.
Conclusão
A sanção da Lei Complementar 214 marca o início de uma nova era na tributação brasileira. Com foco na simplificação, justiça fiscal e estímulo ao crescimento, a reforma promete transformar a relação entre contribuintes e o Fisco. A partir de 2026, os brasileiros começarão a sentir os impactos dessas mudanças, que devem se consolidar até 2033. Enquanto isso, o debate sobre os vetos e ajustes necessários continuará no Congresso, em busca de um sistema tributário mais eficiente e equilibrado.